A Medida Provisória 1300/2025, que promove mudanças no marco legal do setor elétrico, traz impactos diretos ao agronegócio ao retirar do produtor rural irrigante e do aquicultor a autonomia para decidir o horário de uso da energia com desconto tarifário. Pelo texto aprovado na Comissão Mista, essa definição passa a ser feita pelas concessionárias de energia, conforme diretrizes da Aneel.
Na prática, agricultores e aquicultores ficarão submetidos a horários impostos pelas empresas, muitas vezes incompatíveis com a realidade do campo. Hoje, a irrigação noturna é fundamental para reduzir perdas por evaporação, melhorar o aproveitamento da água e diminuir o gasto de energia. Com a mudança, a atividade poderá ser deslocada para períodos de maior consumo e menor eficiência, o que eleva significativamente os custos de produção.
Além disso, obrigar os produtores a irrigar durante o dia pode aumentar o volume de água necessário para manter a produtividade, já que será preciso compensar as perdas causadas pelo calor e pela ação do vento em diversas regiões do Brasil. Essa medida contraria os esforços de preservação ambiental e de uso racional dos recursos naturais, ao estimular maior consumo de água justamente quando o setor produtivo trabalha para ampliar a eficiência hídrica e energética no campo.
O deputado Danilo Forte (União-CE) apresentou emenda, justamente para corrigir esse problema e garantir que o produtor mantenha a prioridade de escolha sobre o horário da irrigação e da aquicultura. A proposta estabelecia que os descontos especiais fossem aplicados por até 8h30 diárias, definidas em consenso entre concessionárias e produtores, para assegurar a prioridade de escolha ao consumidor. No entanto, a emenda não foi acatada pelo relator da medida, o que mantém os riscos para o setor.
“Hoje, esses descontos só valem de madrugada. Isso foi criado no passado para aliviar o sistema elétrico nos horários de pico, mas já não atende à realidade do campo. Em muitas regiões, os produtores precisam irrigar durante o dia, quando o sol e o clima exigem maior uso de água. Por isso, apresentei o PL nº 1.638/2025 e a Emenda 406, que modernizam o modelo e permitem que o produtor escolha o período mais adequado, inclusive durante o dia, de forma regulada pela Aneel”, explicou o parlamentar.
Segundo Forte, garantir ao produtor a decisão sobre o horário de irrigação é essencial para assegurar eficiência hídrica, segurança na produção e melhor aproveitamento da energia solar. “Se essa mudança não for aprovada, produtores de frutas e pescados continuarão enfrentando desperdício de água, maior custo de energia e menor competitividade. Isso significa impacto direto no preço final, perda de eficiência e atraso na transição energética do setor rural”, completou.
A Associação Brasileira das Indústrias de Pescados (Abipesca) também manifestou preocupação com a alteração. Para a entidade, a oxigenação noturna da água é indispensável para a sobrevivência de espécies cultivadas, como peixes e camarões. Durante o dia, a fotossíntese das microalgas auxilia na liberação de oxigênio, mas à noite esse processo cessa, enquanto a respiração dos organismos aquáticos consome o oxigênio disponível. Sem o desconto contínuo no período noturno, a operação de aeradores pode se tornar inviável, comprometendo a produtividade, a saúde animal e a competitividade do setor.
Estudos técnicos indicam que a irrigação noturna pode reduzir o consumo de água em até 15% e gerar também economia de energia. Ao entregar às distribuidoras o poder de determinar os horários, a MP 1300/25 compromete a previsibilidade de custos, fragiliza a eficiência produtiva e ameaça a competitividade do agro brasileiro, justamente no momento em que o setor já enfrenta restrições de acesso a mercados internacionais, como as tarifas impostas pelos Estados Unidos.