As dificuldades enfrentadas por pequenos agricultores para se terem acesso à assistência técnica e extensão rural motivaram o governo a desenvolver o programa Ater Digital. Como vai funcionar a iniciativa, os gargalos a serem enfrentados e as metas propostas foram tema da live do projeto Conexão Brasília realizada na noite dessa terça-feira, 8. Promovido pelo Canal Rural em parceria com a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), o debate teve a participação do secretário de Agricultura Familiar e Cooperativismo do Ministério da Agricultura, Fernando Schwanke; do deputado Zé Silva (SD-MG) e do presidente da Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (Anater), Ademar Silva Júnior.
Schwanke explicou que o programa vai além da distribuição de recursos e desenvolvimento de uma plataforma digital. “É um sistema de governança para que a gente possa utilizar essas ferramentas que estão surgindo, e a pandemia trouxe muitas oportunidades. A gente viu acontecer muita coisa para que a gente possa ampliar a base de atendimento, de assistência técnica no Brasil”, afirmou.
O secretário do Mapa se referiu ao uso dos meios digitais para comercialização de produtos -especialmente de agricultores familiares que, de um dia para o outro, viram fechar restaurantes, feiras livres, escolas, entre outros estabelecimentos que compravam produtos do setor. Várias iniciativas pelo país, que envolveram desde grupos de WhatsApp até a criação de aplicativo, estão sendo usados para facilitar esse comércio.
No caso do Ater Digital, Fernando Schwanke informou que o programa é composto por cinco eixos com foco central para o atendimento de agricultores familiares. E, no momento, está em execução o primeiro deles, que trata da modernização da infraestrutura de TI das empresas de assistência técnica e extensão rural, as Emater´s. “Este ano já repassamos R$ 25 milhões para as Emater´s comprarem tablets, reforçarem o sistema informatizado”. Além disso, o programa envolve a organização e o intercâmbio de informações; o compartilhamento de sistemas e aplicativos; a capacitação dos extensionistas e a formação de um HUB de informações dessa gestão tecnológica.
A meta do governo é expandir a Ater para 50% dos agricultores familiares até 2030. Hoje, apenas 18,2% desses agricultores declaram ter acesso a algum serviço de assistência técnica e extensão rural, conforme o último Censo Agropecuário do IBGE. No Norte e Nordeste, esse percentual cai para 7,3% e 8,8%, respectivamente.
A primeira experiência efetiva do Ater Digital deve começar no ano que vem, com um projeto piloto no Nordeste do país. Cerca de 100 mil pequenos produtores vão receber informações via mensagem de texto. O trabalho vai começar pela cadeia da caprinovinocultura e depois se estender para milho e feijão caupi.
O modelo a ser usado terá como base o desenvolvido pelo vencedor do prêmio Nobel de Economia, Michael Kremer. “Ele desenvolveu uma teoria econômica que mostra que, levando informações simples, mas relevantes, você consegue mexer tanto com a renda como na produtividade dos agricultores”, esclareceu o secretário do Mapa. Se houver uma resposta positiva, a ideia é levar a iniciativa para 1 milhão de agricultores. Esse mesmo modelo já é usado na Índia e em países da África.
Gestão
Para que essa expansão da Ater no Brasil tenha sucesso, os participantes da live concordam que é necessária a organização de ações dos órgãos do governo federal, dos estados e empresas privadas que atuam com assistência técnica e extensão rural.
“Não é só falta de recurso. É fortalecer a Anater. Quando falo em fortalecer, o cooperativismo tem recurso, o Sistema S tem recurso. Falta uma engenharia de consenso para que todos os produtores rurais tenham Ater”, opinou o deputado Zé Silva. Ele acredita que, com esse trabalho que está sendo desenvolvido agora com o apoio da ministra Tereza Cristina, será possível avançar. O deputado, que é extensionista, lembrou o impacto da Ater na produção agropecuária. “Segundo dados do IBGE, aquele agricultor que tem assistência em relação ao que não tem, ele aumenta em quatro vezes o valor bruto da sua produção hectare/ano”.
O presidente da Anater lembrou que hoje há ações de Ater pulverizadas em vários órgãos do governo. “Precisamos organizar e dar um direcionamento único para esse trabalho. A gente tomou como meta fazer uma organização da assistência técnica num único canal que seria a Anater”, pontuou.
Ademar Silva Júnior defendeu ainda a importância do direcionamento desse trabalho conforme as peculiaridades de cada região. “Precisamos regionalizar e saber o que funciona na assistência técnica no Norte do país”, exemplificou. No país, há hoje quatro milhões e 100 mil agricultores familiares espalhados por todas as regiões.
“Nós precisamos acertar uma forma diferente, moderna, muito ágil, com qualidade, mas também com custo menor para que a gente possa abraçar todos esses produtores do Brasil”, acrescentou o presidente da Anater, ao contar que, no momento em que chegou a pandemia, a agência tinha contratos em andamento para atender presencialmente 95 mil famílias em dois mil municípios. Ação precisou ser paralisada de um dia para o outro. Daí já surgiu a necessidade do uso de ferramentas – como o WhatsApp – para se levar informação a esses agricultores.
Conectividade
Uma dificuldade importante nesse processo de digitalização é a falta de acesso à conectividade no meio rural. O deputado Zé Silva citou como está a realidade em países como a China que, segundo ele, tem 4,7 milhões de torres que transmitem o sinal 5G; nos Estados Unidos são 970 mil torres. Já no Brasil, há 97 mil torres. Por isso, ele destacou o trabalho da FPA para aprovação do PL 172, que permitirá uso dos recursos do Fust (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações) para ampliar a banda larga no campo. O texto já foi para a sanção presidencial.
“Esse projeto vai permitir que a internet de banda larga possa chegar em 100% das estradas rurais nos próximos três anos, segundo estudo do próprio Mapa. Em 2021, haverá o leilão 5G. Estamos preparando a infraestrutura mínima básica para a chegada da Ater Digital”, expôs Zé Silva.
Ademar Júnior, Fernando Schwanke e Zé Silva têm a mesma opinião de que a Ater Digital não vai substituir a atuação presencial do extensionista. Mas, eles concordam que será um braço fundamental para expansão desse serviço. “A Ater remota, com certeza, vai ser uma revolução na agricultura familiar no Brasil”, finalizou o presidente da Anater.