“Não o desejamos como uma pasta de segundo escalão”. Esta é a opinião do deputado que, numa concorrida solenidade, assumiu, no último dia 24 de fevereiro, a presidência da FPA – um dos mais organizados e combativos colegiados que atuam no Congresso Nacional. Ele substitui o deputado gaúcho Luis Carlos Heinze (PP-RS). Reeleito com 116 mil votos para um terceiro mandato (2015-2018), o médico, professor universitário e produtor Marcos Montes sempre foi um dedicado defensor do setor produtivo rural, cuja liderança lhe permitiu ocupar, já no primeiro mandato, a presidência da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural (CAPADR) da Câmara Federal.
AGROANALYSIS: ASSUMIR A PRESIDÊNCIA DA FRENTE PARLAMENTAR DA AGROPECUÁRIA (FPA) É DESAFIADOR NESTE MOMENTO TENSO POLITICAMENTE?
MARCOS MONTES: Neste momento, é desafiador, sim. Aliás, é desafiador em qualquer momento, em qualquer circunstância. Nossa entidade é suprapartidária, com pautas e interesses diversos. Contudo, quando discutimos determinados temas em nossas reuniões-almoço de todas as terças-feiras, passamos a ter um partido único, ou seja, o partido da agropecuária brasileira. No seio da FPA, defendemos intransigentemente o setor produtivo rural, seus interesses, suas causas, suas bandeiras. Nosso foco, aqui, é o fortalecimento deste setor, que é, sem sombra de dúvida, o mais exitoso da nossa economia. Os números comprovam essa minha afirmação: ele representa 24% do PIB, 30% dos empregos e mais de 40% das exportações. É um setor pujante, que bem que poderia merecer mais atenção do Governo. Meu sentimento é de que, por meio do diálogo, das negociações e de muita conversa, é possível desanuviar esse cenário.
EM TERMOS DE REPRESENTATIVIDADE, A FPA CONTA COM QUANTOS PARLAMENTARES?
MM: Temos, hoje, 205 parlamentares, entre deputados e senadores, com perspectiva de alcançarmos em torno de 250 ou 260 membros. Além daqueles considerados pioneiros, muitos estreantes estão demonstrando interesse em se integrar à FPA. Afinal, a nossa bancada é uma das mais combativas e uma das mais organizadas no Congresso Nacional. Todos reconhecem. É esse vigor, essa união, essa sinergia, em defesa do setor produtivo rural, que nos motiva a pressionar e reivindicar medidas necessárias e prioritárias do agronegócio brasileiro, que não são poucas.
FALA-SE MUITO NA VALORIZAÇÃO DO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO (MAPA). COMO ISSO É POSSÍVEL?
MM: Logo após a eleição presidencial, os boatos começaram a veicular nomes que iriam compor a nova equipe da presidente Dilma Rousseff. Fui entrevistado sobre o assunto, e o repórter citou para mim alguns nomes ventilados naquela época e me perguntava o que eu achava de fulano, de beltrano ou de sicrano. Respondi que não nos importa o nome; o que nos importa é o fortalecimento da pasta. Entendo que, estando o Ministério da Agricultura fortalecido, fortalecido será também o agronegócio brasileiro. Não o desejamos como uma pasta de segundo escalão. Sua valorização virá por meio de força política para confrontar outros ministérios e de o seu titular ter um diálogo direto com a presidente Dilma, e não ficar despachando e mendigando recursos com os ministros da Fazenda ou do Planejamento, saindo, muitas vezes, dessas audiências de mãos abanando. Antes mesmo que me pergunte sobre a ministra Kátia Abreu na Agricultura, já lhe antecipo a resposta: ela nos dá esperança pelo vasto conhecimento do setor e da vida política, e é inegável a sua contribuição maiúscula na defesa do agronegócio, haja vista a aprovação do Código Florestal, que teve na CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) um dos principais pilares desta conquista. Ademais, ela já exerceu a presidência da FPA e conta com a nossa simpatia e respeito.
NA AGENDA DA FPA, QUAIS SERIAM OS ITENS PRIORITÁRIOS?
MM: Uma das preocupações dos agricultores diz respeito à segurança jurídica, a tão desejada paz no campo. É por esse caminho que trilhamos. Assim, defendemos que as demarcações das terras indígenas passem também pelo Congresso Nacional. Por isso mesmo é que queremos aprovar a PEC 215. No ano passado, não conseguimos, mas, neste começo de legislatura, já conseguimos desarquivá-la. Acredito que, daqui para frente, tudo vai ser diferente, muito embora estejamos enfrentando ações de ONGs estrangeiras, que, aliadas a algumas brasileiras, tentam, de todas as formas, impedir nosso trabalho. Não vamos desistir desta PEC. Veja que a sanha da Funai em expandir as demarcações de terras indígenas não tem limites. Raro é o dia em que não aparecem no Diário Oficial da União decretos com novas áreas para estas demarcações. Temos outras prioridades, como o seguro rural, a lei de acesso aos recursos genéticos – que acabamos de aprovar –, uma nova legislação de defesa agropecuária, infraestrutura e logística, emplacamento de máquinas agrícolas, terceirização do trabalho, legislação para aquisição de terras por estrangeiros e a regulamentação da lei sobre trabalho escravo. Há muita celeuma e incompreensão sobre este tema do trabalho escravo. O que nós queremos é uma definição clara e objetiva no texto do que realmente seja trabalho degradante, estafante e análogo ao trabalho escravo, para que o empregador, principalmente do meio rural, não fique à mercê dos agentes públicos, que, muitas vezes, interpretam a legislação trabalhista ao seu bel prazer. Isso é inadmissível.
COMO A FPA PRETENDE TRABALHAR ESSES ITENS?
MM: Com muita dedicação, muita negociação, muita articulação política, muito empenho e muita sinergia. Esses itens representam as demandas das cadeias do setor produtivo rural. Na verdade, são as entidades representativas do agronegócio que nos trazem suas demandas. É bom lembrar, também, que os parlamentares trazem de suas regiões as reivindicações dos seus eleitores, seus apoiadores, pois muitos deles têm presenças marcantes no meio rural. Nosso lema, neste ano, é: “valorizar a produção é um prato cheio para a população”.
A ESTIAGEM E A ESCASSEZ DE ÁGUA DEVEM AFETAR A PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA?
MM: Com absoluta certeza. Entidades como a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) e o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em suas próximas avaliações de safra, vão apontar o tamanho dos prejuízos que a escassez de água provocou na produção agropecuária. É claro que os estragos variam de região para região e de cultura para cultura. Os hortifrutigranjeiros foram severamente afetados. Esse fenômeno – estiagem – é preocupante; inclusive, a Embrapa vem acompanhando há muitos anos essa situação. A agricultura é responsável por 70% do consumo de água do País e será afetada dramaticamente pela crise hídrica. Ainda não dá para dimensionar os reais prejuízos, porque não se sabe até quando esse fenômeno vai perdurar, mas as perdas no setor são bilionárias. Estamos, sim, preocupados com esse cenário, tanto que decidimos promover um seminário para debater esse tema e buscar soluções.
QUAIS SERIAM AS PRIORIDADES PARA AJUDAR A AMENIZAR O PROBLEMA?
MM: Nesse caso, entendo que o nosso papel seria o de ouvir o setor produtivo para dimensionar os danos, os prejuízos; acolher suas reivindicações, debatê-las de forma democrática e transparente; e buscar soluções junto aos órgãos do Governo e no Congresso Nacional. A renda agrícola será afetada severamente, e muitos produtores e cooperativas terão dificuldades em honrar seus compromissos com os agentes financeiros. Longe de ser catastrófico, assusta-nos esse cenário. Se o nosso setor, que é o mais pujante, for afetado como se diz, a economia brasileira perderá força, o Governo ficará atordoado, e, então, a melancolia vai prosperar.
QUAL É A IMPORTÂNCIA DO SEGURO RURAL NESSA QUESTÃO?
MM: Fundamental. Veja que o princípio básico da subvenção ao seguro rural é proteger o agricultor das ações de eventos adversos como o que está ocorrendo. É preciso que o governo federal cumpra de maneira tempestiva os compromissos firmados com o setor na liberação dos recursos. O Governo precisa compreender que seguro rural existe para proteger e amparar o agricultor contra a quebra de safra, queda na produção decorrente de adversidades climáticas, sendo a principal ocorrência a crise hídrica para algumas lavouras. É preciso levar mais a sério esse programa. Veja que, no lançamento do Plano Agrícola 2014/15, a presidente anunciou com pompas e galas R$ 700 milhões para o seguro, mas apenas R$ 400 milhões foram liberados. Embora os outros R$ 300 milhões tenham sido aprovados e orçados, os Ministérios do Planejamento e da Fazenda não liberaram; não sei se por descuido ou deliberadamente. Agora, só nos resta correr atrás destes recursos. É o que estamos fazendo.
TEREMOS PROBLEMAS QUANTO AOS PREÇOS DOS ALIMENTOS E SEUS IMPACTOS SOBRE A INFLAÇÃO?
MM: ‘Teremos’, não; já temos, sim, problemas de preços dos alimentos. Qualquer dona de casa que frequenta supermercados, feiras livres ou qualquer comércio já percebe a elevação dos preços em tudo aquilo que consumimos. O espectro da carestia, da inflação, está não só nestes locais, mas também à nossa volta, mas estamos dispostos a nos empenhar e contribuir para suavizar tal cenário. O setor produtivo de alimentos tem essa grande vantagem, que é gerar resultados imediatos. É só tratá-lo de maneira adequada que a pujança brotará e florescerá por esse Brasil adentro.