Fruto de amplo debate no Congresso Nacional, o projeto de lei (PL 364/2019), que versa a respeito dos campos de altitude, tem sofrido uma distorção de entendimento oriunda, provavelmente, da pouca dedicação para se debruçar no assunto. Afinal, a proposta não tem qualquer relação com desmatamento ou abertura de novas áreas na Mata Atlântica, mas tão somente, faz valer a consolidação de uso que já está prevista no Código Florestal, desde 2008.
O projeto se aplica apenas às áreas consolidadas, antropizadas, com atividade agrossilvipastoril preexistentes a 22 de julho de 2008, nos termos do próprio Código Florestal, sancionado e em vigor desde o ano de 2012. Importante ressaltar, que a proposta altera o Código Florestal brasileiro, mas em nada altera a Lei da Mata Atlântica. Isto é, não se aplica a áreas com florestas nativas, mangues, e outros tipos de vegetação com interesse ecológico. Portanto, só se aplica em campos antropizados, e assim, promove a regularidade das ações ambientais nas propriedades rurais, em especial a proteção das APPs e reserva legal.
De autoria do deputado federal e ex-presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), Alceu Moreira (MDB-RS) e com a relatoria do também integrante da bancada, deputado federal Lucas Redecker (PSDB-RS), o texto aprovado oferece um tratamento específico para a vegetação nativa dessas regiões, de modo que haja sua proteção, mas, também, a possibilidade de sua utilização pelos produtores rurais que ali vivem. Além disso, fixa regime jurídico para corte, supressão, exploração, manejo e recuperação da vegetação, além de regulamentar práticas agrícolas e de coleta.
A proposição oferece um tratamento específico para a vegetação nativa dos campos de altitude associados ou abrangidos pelo Bioma Mata Atlântica, de modo que haja sua proteção, mas, também, a possibilidade de sua utilização pelos produtores rurais. Se a vegetação nativa já era utilizada como pastagem, seria um enorme contrassenso obrigar o produtor a substituí-la para que pudesse ser contemplado pelas “disposições transitórias” do Código.
O consultor jurídico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), destaca que comentários negativos beiram a insanidade, como a de que o projeto de lei vai permitir a abertura de 48 milhões de hectares. “Isso é uma loucura e uma imensa conversa furada. Essa área é, praticamente, toda a área agricultável do Brasil e se abríssemos quebraria a própria agricultura pelo excesso de oferta e os preços como estão”, explica Justus.
O representante da CNA acrescenta que o projeto nasceu pela necessidade de trazer clareza quanto à aplicabilidade da Área Rural consolidada, gerada por um conflito de legislações. Além disso, se aplica exclusivamente para áreas consolidadas, definidas pelo Código Florestal, bem como em áreas de campos nativos com atividades pastoris, ou seja, com ações antrópicas preexistentes a 22 de julho de 2008. Sendo respeitado, portanto, o disposto no mesmo livro de leis.
Regularização de imóveis
A proposta, inclusive, vai além dos aspectos disciplinares que abrangem a proteção, a regeneração e a utilização dos campos de altitude. O projeto de lei reforça, ainda, a necessidade de regularização dos imóveis, ponto primordial para salvaguardar o direito de propriedade e garantir ao produtor rural o poder de exercer a livre iniciativa dentro das áreas rurais consolidadas.
No mesmo sentido, o artigo 82-B da proposta, também alvo de desinformação, apenas corrobora a intenção inicial do legislador, ao editar o Código Florestal, no sentido de que suas regras diferenciadas de regularização ambiental se aplicam para o todo o país, suprindo a insegurança jurídica de eventual alegação de conflito com outras legislações federais, como no caso da Lei da Mata Atlântica.
Esse cenário de insegurança jurídica é um dos fatores decisivos para dificultar a efetiva implementação do Código Florestal e, por conseguinte, a regularização ambiental de imóveis rurais com base em tais regatas diferenciadas.
O que dizem os parlamentares
Alceu Moreira explica que é preciso manter a proteção da região, mas, ao mesmo tempo, permitir ao produtor rural desenvolver suas atividades sem que esteja sujeito a multas, embargos, processos e aborrecimentos de toda ordem. “Essa alteração legislativa é fundamental para que a produção agrícola das regiões de campos de altitude não seja completamente anulada”, explica Alceu Moreira.
De acordo com Lucas Redecker, a matéria é benéfica para o setor agropecuário e para o país, o substitutivo supera as controvérsias e maximiza a proteção ao meio ambiente. “Temos que deixar claro que o texto tem relação total com proteção ambiental. É para a preservação e jamais para desmatar. A matéria foi amplamente discutida e estamos dando um passo essencial para o desenvolvimento do meio ambiente e do nosso país”, ressaltou.