A expectativa é que nesta hoje o diretor-geral da OMC, Roberto Azevêdo, faça um relato sobre a persistência das divergências, após as intensas consultas que realizou nas ultimas semanas na busca de soluções aos impasses.
Azevêdo deverá insistir em que está chegando realmente o momento de os países tomarem decisões políticas importantes, para fechar ou não a Rodada Doha, depois de 14 anos de dificuldades. Na cena comercial, o sentimento é que, se a negociação não for finalmente concluída em dezembro, na reunião em Nairóbi (Quênia), será abandonada de vez, ainda que sua morte não seja decretada formalmente.
Por isso, a avaliação de Azevêdo estará no centro de parte de reunião, considerada crucial, de 15 ministros de Comércio na sexta-feira em Paris, organizada pela Austrália.
O maior problema continua sendo na agricultura. Não está claro como as tarifas serão cortadas, como alíquotas especialmente altas serão tratadas, se os subsídios à exportação serão realmente eliminados e como apoio governamental a preço e renda e outros subsídios domésticos serão reduzidos ou disciplinados.
A situação se complica ainda mais com um confronto entre EUA, China e Índia. É que na maioria dos paises, incluindo os europeus e o Japão, existe espaço para fazer cortes no apoio interno dado pelo governo. O país com mais dificuldades é precisamente os Estados Unidos. No caso americano, redução de subsídio interno significará mudar a lei agrícola, algo que o Congresso americano não parece ter a menor disposição de aceitar.
Na defensiva, os americanos alegam que não têm como cortar domesticamente seus programas de ajuda quando grandes emergentes, como China e Índia, aumentaram enormemente as suas subvenções agrícolas.
Em 2012, a China elevou em 40% os subsídios concedidos a seus agricultores, totalizando US$ 165,6 bilhões – mais do que a União Europeia (US$ 106,9 bilhões) e os EUA (US$ 30,1 bilhões) juntos, segundo a Estimativa de Apoio ao Produtor (PSE, ou Producer Support Estimate) da OCDE, indicador do valor monetário bruto anual transferido por consumidores e contribuintes como ajuda aos agricultores.
As alegações dos EUA são só parcialmente verdadeiras. O volume dos subsídios chineses representa 8,5% do valor da produção, abaixo dos 10% permitidos. Na India, está nesse limite.
Mas os americanos insistem na importância da “visibilidade” das cifras relacionadas aos chineses e indianos. Alegam que os números absolutos são muito altos e reduzem o espaço de convencimento no Congresso americano. Já chineses e indianos acham que Washington quer desviar a atenções, para não ter de pagar o preço das barganhas necessárias na busca de um acordo.
Como em todo caso um eventual corte de subsídios agrícolas nos países ricos será menor do que o inicialmente discutido, a China, a Índia, a Indonésia e vários outros países em desenvolvimento importadores insistem com uma proposta que, em julho de 2008, fez fracassar uma tentativa para concluir as negociações. A ideia é permitir que países em desenvolvimento elevem as suas tarifas temporariamente quando as importações agrícolas aumentarem subitamente ou os preços declinarem (mecanismo especial de salvaguarda).
O problema está nos detalhes. Desta vez, Índia, China e outros endureceram a proposta. Alegam que precisarão de mais espaço para frear a invasão de produtos altamente subsidiados de paises ricos e para lidar com os reflexos deletérios dessa invasão sobre seus próprios agricultores.
Na prática, ficaria mais imprevisível o acesso de países exportadores agrícolas, como EUA, Brasil e Argentina, a mercados emergentes como China, Índia, Indonésia, Turquia e Coreia do Sul, entre outros.