Ao lado de outros ruralistas, deputado diz que, sem a nova lei, a sociedade corre o risco de desabastecimento e encarecimento dos produtos
Num esforço concentrado pela votação do projeto de Lei (5943/2013), a bancada ruralista se uniu pela aprovação do requerimento de urgência para apreciação da proposição. “Transportadores de produtos agrícolas e industriais suportaram até o limite as incoerências da legislação vigente. Se a situação perdurar, vamos ver o massacre da categoria, seguido dos prejuízos a toda sociedade, com o desabastecimento e encarecimento de preços”, alertou o deputado federal Junji Abe (PSD-SP), nesta terça-feira (01/04/2014), durante reunião da FPA – Frente Parlamentar da Agropecuária.
Sub-relator da comissão especial que analisou a chamada Lei dos Caminhoneiros (12.619, de 30 de abril de 2012), Junji explicou que a revogação da legislação atual e a vigência de outro texto, “legitimamente discutido com as lideranças das áreas envolvidas com a questão, é o único meio de acabar com as graves distorções das normas vigentes, que ameaçam a sobrevivência da categoria de caminhoneiros, massacram os setores produtivos, trazem o risco de desabastecimento e a certeza de preços bem maiores aos consumidores”.
Presidente da Pró-Horti – Frente Parlamentar Mista em Defesa do Segmento de Hortifrutiflorigranjeiros, Junji trabalhou ao lado do relator, deputado Valdir Colatto (PMDB-SC), na elaboração do projeto aprovado na comissão. O PL 5943/2013 precisa ser apreciado no Plenário da Câmara. Se receber aval da Casa, a matéria será submetida ao Senado. Havendo aprovação do Congresso, o texto irá para sanção presidencial.
O projeto de Lei da comissão, apresentado em julho último (11/07/2013), permite ao motorista dirigir por até seis horas ininterruptas. A lei atual estabelece que ele dirija por até 4 horas seguidas. Este foi um dos pontos atacados pelo Planalto, com o auxílio de alguns parlamentares que trabalharam fervorosamente em defesa da vontade do governo de manter a legislação vigente.
Igualmente, existe uma grande pressão de pressão de centrais sindicais do trabalho para manter a legislação vigente. Na outra ponta, transportadores e autônomos dependem da nova lei para manter as atividades. “Estão sofrendo todo tipo de fiscalização e arcando com multas por não cumprirem exigências que a própria estrutura das rodovias não dispõe, como postos de serviços para descanso”, observou Junji.
A expectativa dos ruralistas é aprovar o requerimento (9038/2013), do deputado Celso Maldaner (PMDB-SC), que prevê regime de urgência para apreciação do PL 5943/2013. As dificuldades para levar a proposta ao Plenário eram previsíveis desde a votação do texto na comissão. Na tumultuada reunião, em julho último (03/07/2013), que terminou com a aprovação do parecer de Colatto e Junji, houve parlamentares que acusaram a relatoria de valorizar mais a carga transportada do que a vida humana. O comentário teve a intenção de atingir o sub-relator que, em várias oportunidades, havia alertado que os períodos de descanso estabelecidos pela legislação inviabilizavam o transporte de produtos perecíveis e de carga viva, considerando que alimentos se estragariam, correndo o risco de contaminação.
Na prática, o novo texto permite ao motorista elevar em 1h30 o tempo ininterrupto de direção, considerando que foram mantidos os 30 minutos obrigatórios de descanso. “O fato de conduzir o veículo por 5h30 em vez de 4 horas não é o fator que coloca vidas em risco. O que faz isto é a precariedade das rodovias, a concentração dos deslocamentos de cargas no modal rodoviário e os longos períodos desperdiçados em congestionamentos monstruosos”, expôs Junji.
Nada vale mais do que a vida humana, como assinalou Junji. Ele disse que invocar este conceito numa discussão como a da Lei dos Caminhoneiros não passava de uma tentativa desesperada de “tentar deixar tudo como está, ignorando a voz dos setores envolvidos”. O sub-relator lembrou aos parlamentares contrários ao projeto que “estamos no Brasil e não podemos querer aplicar aqui normas excessivamente protecionistas que funcionam na Suíça, na Suécia, no Japão e em outros países de Primeiro Mundo”.
Segundo Junji, os míni, pequenos e médios profissionais de todas as áreas econômicas no Brasil vêm sendo esmagados por grandes conglomerados que adquirem os menores ou se fundem com multinacionais. As normas vigentes em relação ao tempo ininterrupto de volante significam a falência dos motoristas autônomos que não conseguem ter receita suficiente para manter sua atividade. “Eu pergunto: quem serão os excluídos da categoria de caminhoneiros?”.
Os transportadores autônomos que deixarão a atividade, se não houver uma legislação adequada, engrossarão a fila de desempregados em busca de vagas nas grandes transportadoras. “Certamente, isto só trará efeitos negativos para os assalariados”, considerou Junji. Em recente pesquisa, citou ele, oito em cada dez brasileiros declararam que desejam trabalhar por conta própria. “Sepultar os condutores autônomos é o mesmo que sufocar o sonho das pessoas que lutam para ter o próprio negócio”, comparou.
O projeto apresentado pela comissão especial também prevê distinção entre contratados e autônomos. O motorista assalariado continua obrigado a ter uma pausa de 11 horas depois de 24 horas de direção. Já aquele que trabalha por conta própria pode reduzir o período para dez horas, podendo fazer isso dentro do próprio veículo. Além disso, conforme a proposta, os profissionais que ultrapassarem o tempo de direção permitido só poderão ser multados depois que o Dnit – Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes tiver efetivado a homologação dos pontos de parada.
Rememorando o saldo dos debates realizados com lideranças ligadas aos setores atingidos pela legislação, Junji apontou os protestos de entidades de caminhoneiros. “Com razão, acusavam que as rodovias não têm infraestrutura adequada para oferecer locais de descanso em número suficiente e de forma segura”. Ele reiterou que a ampla discussão propiciada pela comissão efetivou o que deveria ter sido feito antes da vigência da lei: “dar voz à população afetada”.
A legislação atual aumentou o Custo Brasil, acarretando o encarecimento de cerca de 30% no frete. “É evidente que a conta vai para o bolso do consumidor final”. Junji acrescentou que os altos custos de produção e operação, somados às deficiências de infraestrutura, achatam as chances de competitividade do País no mercado internacional.
Ainda na proposição, figura a proposta de redução do valor do pedágio cobrado dos caminhoneiros. A norma atual prevê a definição do preço com base no número de eixos do veículo. O texto sugere que a cobrança incida somente sobre a unidade tratora, conhecida como cavalo. Os deputados a serviço da vontade do governo quiseram derrubar, de qualquer maneira, a inclusão do tema na nova legislação.
Ocorre, segundo Junji, que o preço dos pedágios está diretamente ligado à atividade de transporte, afetando não só a categoria, mas todas as cadeias produtivas. Outra inovação constante do projeto é a cobrança das multas dos motoristas estrangeiros que trafegam no País. A ideia da relatoria é a aplicação do princípio da reciprocidade: em muitos países da América do Sul, o condutor só pode deixar o território nacional depois que tiver quitado as multas. O texto também torna obrigatório o exame toxicológico para motoristas profissionais.
Incoerências da lei
Além do tempo de viagem que compromete a qualidade dos produtos perecíveis, o deputado federal Junji Abe apontou a acentuada perda de produtividade dos caminhões, decorrente da legislação em vigor. Estudos mostrados por participantes dos debates, realizados pela comissão especial, confirmaram o aumento dos custos em patamares que vão de 4,7% para percursos de até 200 quilômetros até 57,1% para 450 quilômetros. Neste último, o tempo de deslocamento dobra de um para dois dias. O levantamento considera motorista contratado no regime da CLT – Consolidação das Leis do Trabalho.
Os defeitos da legislação, segundo Junji, tornam-se ainda mais sérios em razão da precariedade da logística de deslocamentos no País. “O sistema ferroviário, lamentavelmente, continua sucateado. O transporte de cargas sobre rodas é quatro vezes mais caro que pelas ferrovias. Todo fator que pressione os custos já recai sobre o preço final dos produtos”, reclamou, ao defender a urgência de maiores investimentos na implantação e modernização da linha férrea como meio de otimizar os deslocamentos de cargas e de pessoas no Brasil.
Representante máximo do segmento de hortifrutiflorigranjeiros no Congresso, Junji já havia alertado para os problemas da Lei dos Caminhoneiros no caso dos itens perecíveis. A participação de representantes de associações e sindicatos de produtores, distribuidores e centrais de abastecimento de alimentos em um dos debates da comissão, confirmou as preocupações.
O complexo Ceagesp – Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais do Estado de São Paulo, o maior da América Latina e passagem obrigatória de boa parte das cargas de produtos agrícolas distribuídos no País, corre o risco de ter sua operação paralisada em prejuízo do abastecimento no Brasil inteiro, se perdurarem as incoerências da Lei dos Caminhoneiros, como pontuou Junji.
O caso do entreposto paulistano sofre a agravante das restrições impostas pelo Município de São Paulo à circulação de caminhões. De acordo com Junji, é proibido o tráfego de veículos pesados em extensos horários, ao longo de amplos e importantes trechos da Capital, como as Marginais do Tietê e Pinheiros. “Esta norma, somada com as determinações da legislação, torna impraticável o abastecimento”, advertiu o deputado, avaliando que o projeto apresentado pela comissão “corrige defeitos flagrantes” nas normas vigentes.