Há quase quatro anos, o Congresso Nacional começou a discutir um dos marcos mais importantes da modernização da defesa agropecuária brasileira: a criação de programas de autocontrole para as empresas do setor, sem retirar o poder de polícia do Estado. O modelo, que nasceu no PL 1.293/2021, fortalece a fiscalização oficial, amplia a capacidade de atuação do serviço público e moderniza procedimentos com base em tecnologia, risco sanitário e eficiência.
Desde o início da tramitação, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) conduziu as negociações técnicas e políticas com o Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) e com o setor produtivo. O tema foi trabalhado desde 2020, quando as primeiras minutas começaram a ser desenhadas pelo órgão.
Tramitação na Câmara dos Deputados
Na Câmara, o projeto teve dois relatores da FPA. O deputado Domingos Sávio (MG) cuidou da relatoria na Comissão de Agricultura e defendeu o fim da “legislação da metade do século passado”, que reduzia a competitividade das indústrias e criava gargalos para o crescimento do agro. Já na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), o deputado Pedro Lupion (PR), presidente da FPA, conduziu a etapa decisiva da votação, garantindo o apoio político necessário para consolidar o texto.
“É um processo que, infelizmente, por falta de capital humano, o Estado não tem como manter sozinho. O agro cresceu, a demanda aumentou, e precisávamos de um modelo capaz de dar agilidade, segurança e previsibilidade à fiscalização”, explicou Lupion.
Com a aprovação na Câmara, o projeto seguiu para o Senado.
Aprovação no Senado Federal
Em dezembro de 2022, o Senado aprovou a proposição com relatoria do senador Luís Carlos Heinze (PP-RS), que também havia relatado a matéria na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA). Heinze rejeitou emendas que fragilizariam o texto e defendeu a evolução do modelo brasileiro de fiscalização.
“A aprovação proporcionará a modernização do processo de fiscalização da agropecuária brasileira, mais segurança jurídica, aprimoramento dos produtos e maior capacidade de atuação do serviço oficial”, afirmou.
A então ministra da Agricultura e atual vice-presidente da FPA no Senado, Tereza Cristina, reforçou que o autocontrole foi construído “a muitas mãos”, com contribuições de fiscais, entidades e representantes do setor produtivo. Segundo ela, o novo modelo moderniza procedimentos, reduz entraves desnecessários e fortalece a credibilidade sanitária do país.
“O autocontrole atende ao pleito de quem produz e de quem fiscaliza. É uma evolução que dá segurança jurídica, reduz burocracias e consolida o Brasil como referência internacional em inspeção e sanidade. Estamos preparando o país para competir mais e melhor”, afirmou.
FPA derruba vetos e restabelece produção on farm
Em junho deste ano, a FPA garantiu a derrubada dos vetos presidenciais ao artigo que assegura aos produtores rurais o direito de produzir bioinsumos para uso próprio, a prática de produção on farm. Com isso, voltou a valer a dispensa de registro para esses insumos, desde que não sejam comercializados. A vitória consolidou um dos pilares da Lei do Autocontrole.
Portaria 861/2025 regulamenta credenciamento para apoio à inspeção
Agora, com a publicação da Portaria MAPA nº 861, de 13 de novembro de 2025, o Ministério da Agricultura conclui a etapa mais importante da implementação da Lei 14.515/2022. A norma regulamenta o credenciamento de pessoas jurídicas para prestar serviços técnicos ou operacionais de apoio à inspeção ante mortem e post mortem no âmbito do Serviço de Inspeção Federal (SIF).
O texto detalha requisitos, responsabilidades, mecanismos de auditoria e punições para infrações leves, graves e gravíssimas, além de vedar conflito de interesses, como vínculo societário com frigoríficos ou bonificações atreladas a resultado. A autoridade máxima nas plantas permanece sendo o auditor fiscal federal agropecuário, preservando integralmente o poder de polícia do Estado.
Ao celebrar a publicação da Portaria 861, Lupion destacou o impacto positivo para toda a cadeia do agro: “Depois de quatro anos de uma construção intensa no Congresso Nacional, hoje nós damos um passo histórico para a defesa agropecuária do Brasil. Esse é um avanço que fortalece quem produz, traz mais segurança para o consumidor e eleva o padrão sanitário que apresentamos ao mundo. A modernização chegou, e chegou com responsabilidade, transparência e sob comando do Estado.”
O que muda na prática
Para o setor, a portaria traz ganhos estruturais:
- Mais agilidade e menos gargalo nas linhas de abate;
- Rastreabilidade reforçada e maior transparência para o consumidor;
- Inspeção oficial fortalecida, com supervisão direta e permanente dos auditores;
- Aprimoramento do ambiente regulatório exigido pelos mercados internacionais.
“Não existe privatização da fiscalização. O poder de polícia continua 100% com o Estado. O que muda é que as empresas passam a ter obrigações técnicas adicionais, enquanto o auditor fiscal agropecuário segue como autoridade responsável”, concluiu Lupion.


