Dilceu Sperafico*
Os desafios dos produtores rurais, transportadores, agroindustriais e comerciantes de alimentos do País e do mundo, não se resumem ao abastecimento do mercado, atendendo exigências e preferências dos consumidores, em termos de diversidade, qualidade e sustentabilidade dos produtos.
Além de alimentar os seres humanos de todas as nacionalidades, raças, idades, escolaridades e poder aquisitivo, é necessário produzir e entregar volume suficiente para o lamentável desperdício.
Conforme levantamento da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), somente na América Latina e Caribe são jogadas no lixo e/ou se permite que se deteriorem 348 mil toneladas de alimentos por dia.
Isso significa que cada habitante da região desperdiça 223 quilos de alimentos por ano, totalizando a perda total anual de 127 milhões de toneladas no continente latino-americano.
Somente com esses produtos desperdiçados se poderia alimentar 300 milhões de pessoas ou 37% dos cidadãos que passam fome em todo o mundo.
Segundo o estudo da FAO, 36 milhões de latino- americanos poderiam atender plenamente suas necessidades calóricas diárias apenas com os alimentos perdidos em pontos de venda direta a consumidores, como feiras-livres, mercearias e supermercados. O contingente representa população maior do que a que passa fome na região.
Conforme avaliação de especialistas, as principais perdas de alimentos na América Latina são de frutas e hortaliças, com 55% do total; de raízes, tubérculos, pescados e mariscos, com 33%; de cereais, com 25%; e de legumes, carnes e derivados do leite, com 20% da produção desperdiçados.
A meta agora é atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, definidos em 2015 pelos governos de países latino-americanos, com base em proposta de rede de especialistas para a criação de estratégia regional de redução de desperdício de alimentos.
Para isso, no entanto, a região deveria reduzir pela metade a perda de alimentos ao longo dos próximos 14 anos ou até 2030. Algumas nações já implantaram comitês voltados ao combate do desperdício de alimentos, mas o Brasil, entre outros países vizinhos, ainda estão em fase de discussão de iniciativas similares.
No planeta, a perda de alimentos prontos para consumo atinge 1,3 bilhão de toneladas por ano, o que equivale a quase um terço dos alimentos produzidos para a sobrevivência do ser humano. A situação é profundamente lamentável não apenas pela perda de alimentos que poderiam matar a fome de tantas pessoas, incluindo crianças, idosos, mulheres e portadores de deficiências físicas e mentais.
Tragédia semelhante acontece com o desperdício de sementes, fertilizantes, defensivos, combustíveis e trabalho de agricultores e de todos os demais profissionais da cadeia produtiva e comercial dos alimentos, que depois de cultivados, colhidos, beneficiados, transportados e expostos à disposição dos consumidores, acabam sendo eliminados.
Se pelo menos fossem aproveitados na produção de adubo orgânico ou na alimentação de animais, os prejuízos seriam atenuados, mas ainda assim continuariam inaceitáveis.
A crueldade está no sofrimento de pessoas passando fome e quase desistindo de viver, enquanto alimentos de qualidade são jogados fora.
Para dimensionar melhor a injustiça, basta imaginar uma mãe tentando consolar o filho chorando de fome, por não dispor sequer de uma fruta para amenizar seu desespero.
*O autor é deputado federal pelo Paraná