Era uma vez uma civilização chamada Lobbyland. Nessa civilização os direitos dos trabalhadores eram defendidos a qualquer custo. Muitos políticos e sindicatos dessa civilização colocavam essa missão acima de tudo!
Próximo da Lobbyland, porém, havia outra civilização chamada Marketland. Nessa civilização os sindicatos eram fracos e os políticos que defendiam os trabalhadores também. Portanto, sempre que havia alguma mudança na lei ou alguma nova tecnologia que fosse prejudicar certos empregos, o projeto era aprovado sem muita resistência.
Para ser mais claro, as diferenças que separavam as duas civilizações estavam em três áreas: tecnologia, comércio internacional e leis trabalhistas.
Será que colocar a demagogia acima dos resultados práticos ajuda o trabalhador no longo prazo?
Em relação à tecnologia, como qualquer mudança que gerasse desemprego sofria resistência, os Lobbylanders ainda viviam sob o uso do lampião. Houve uma tentativa de instalar luz elétrica, mas como esse era um dos setores que empregava muita mão de obra – desde o acendedor de lampião até os próprios fabricantes -claro que esse setor não poderia ser afetado por um avanço bobo como a luz elétrica.
Além do lampião, nas plantações as colheitas eram manuais, pois, embora existissem máquinas colheitadeiras, seu uso prejudicaria a mão de obra, portanto essa mudança também não foi aceita.
Na Marketland, por outro lado, havia luz elétrica e as colheitas eram mecanizadas. Sim, houve um período de transição que gerou desemprego. Trabalhadores protestaram e foram às ruas. Mas, depois de alguns anos, os acendedores de lampião passaram a trabalhar nas fábricas de lâmpadas e os antigos boias-frias passaram a operar tratores e a trabalhar em suas fábricas. Além disso, os trabalhadores viram seus salários e condições de trabalho melhorarem significativamente.
De fato essas tecnologias empregavam menos mão de obra e parte dela não foi absorvida na indústria de lâmpadas nem nas colheitas, mas um efeito ocorreu na Marketland. Como a luz acendia instantâneamente e a colheita era feita em menos tempo, os trabalhadores passaram a ter mais tempo para o lazer, pois produziam a mesma quantidade em menos tempo, aumentando a sua produtividade. Surgiu então uma demanda antes inexistente por entretenimento. Com isso, casas de shows, teatros e restaurantes começaram a surgir absorvendo mão de obra desempregada.
Apesar disso, alguns moradores da Lobbyland se gabavam de não terem cedido a essas evoluções tecnológicas que afetariam os trabalhadores. Não importa se o país vivia à luz de lampião, colheitas manuais e utilizavam charretes.
No comércio internacional tentou-se algumas vezes abrir a economia da Lobbyland. A lógica era a seguinte: se um país produz bem roupas e o outro planta bem laranjas, é mais eficiente cada um focar nas suas habilidades e trocar os produtos. Ao final, haveria mais roupas e laranjas disponíveis para os dois países do que se cada um produzisse seus próprios bens, beneficiando a todos.
Mas, como essa medida poderia matar setores menos competitivos e desempregar os trabalhadores destes setores, claro que houve grande lobby contra isso. Como consequência de um país fechado comercialmente, eles tinham que produzir tudo e não conseguiam fazer isso a um preço razoável, tornando os produtos mais caros para a população.
Na Marketland, ao contrário, sem força para resistir a essa mudança, o projeto de abertura comercial seguiu em frente. Passaram a produzir aquilo em que possuiam vantagem competitiva e a importar aquilo em que os outros países eram mais eficientes.
De fato os setores menos competitivos foram extintos e novamente houve desemprego! Porém, os setores competitivos começaram a exportar mais e absorveram a mão de obra desempregada. Com importações mais baratas, além da inflação mais baixa, os empreendedores passaram a ter acesso a máquinas e equipamentos baratos e melhores.
Apesar disso, alguns na Lobbyland se gabavam de produzir tudo que consumiam. Não importa se os produtos eram caros, se estavam escassos ou se importar máquinas para os empresários era quase impossível. Os empregos deviam ser protegidos.
Em relação aos direitos trabalhistas a Lobbyland era um mar de regalias. Os trabalhadores além de 13º, recebiam 14º salário. Além disso, os custos de demissão eram propositalmente muito altos. Com isso quem iria demitir? Ninguém e isso era ótimo para os trabalhadores, não é mesmo?
Na Marketland os pobres trabalhadores não tinham nem 13º, quem diria 14º. Mas, ao contrário da Lobbyland, os Marketlanders – que já recebiam salários mais altos pois tinha uma economia mais aberta e eram mais produtivos – recebiam tudo que tinham pra receber em 12 parcelas mensais, ao invés de 14.
Como os custos de demissão e contratação eram muito baixos, em tempos de crise, ajustes eram feitos e infelizmente pessoas demitidas. Em tempos de expansão, porém, a empresa contratava muito mais rápido, pois sabia que se houvesse uma crise poderia fazer ajustes, tornando o mercado muito mais dinâmico.
Apesar disso, alguns da Lobbyland se gabavam do 13º, 14º salário, além dos altos custos de demissão. Não importa se em tempos de expansão o empresário pensava cinco vezes antes de contratar, imaginando “se vier uma crise, não poderei demitir as pessoas”. Não importa se o mercado ficava mais ineficiente. Não importa se o trabalhador tinha que esperar chegar em dezembro para receber parte do salário que era seu, o direito dos trabalhadores era assegurado.
Diante dessa ficção, será que aqueles que se dizem tanto a favor dos trabalhadores estão mesmo ajudando? Será que colocar essa demagogia acima dos resultados práticos ajuda o trabalhador no longo prazo?
Felizmente isso é apenas uma ficção e nada disso acontece! Portanto, juntamente com esses políticos e sindicatos, temos que colocar a ideologia acima dos resultados. Aliás, no Brasil estamos na vanguarda da tecnologia, os produtos são baratos e os direitos dos trabalhadores garantem um elevado padrão de vida a todos os brasileiros, não é mesmo?
Leonardo de Siqueira Lima é economista formado pela Escola de Economia de São Paulo da FGV e cofundador do site Terraço Econômico.
Publicado no jornal Valor Econômico, edição dos dias 30 e 31 de maio de 2015